02 julho 2007

Pequena Miss Sunshine.

Existe alguma coisa profundamente tocante vindo da sensibilidade mostrada com simplicidade. Tudo o que é muito suntuoso parece maquilagem pesada de algo que precisa de um esforço maior pra ser revelado. A simplicidade é nua, por isso traz uma aura cristalina nas mensagens que transmite.

A família é a menor unidade representativa do coletivo, do social. Mas cada um de nós é o elemento indivisível dessa unidade. Portanto, quando se trata de família, há algo universal e resumidamente ilustrado por cada componente em sua individualidade. Sonhos, angústias, expectativas, crises, desilusões, esperanças e tantos outros sentimentos e sensações formam um arranjo rico - presente em momentos e intensidade variados - dentro de cada um de nós. Mesmo numa família pequena, onde se pressupõe que os sentimentos sejam mais coletivos e comungados, há o fato inexorável de que cada um tem seu universo.

Pois bem, uma vez que toda essa xaropada ganha forma numa película, por exemplo, cabe ao artista organizar sua percepção de realidade e montar sua obra. E é exatamente aí que reside a linha tênue e estreita da competência: fazer valer com destreza a criatividade nutrida pela sensibilidade. É saber compor algo que seja um retrato digno da realidade e que, de quebra, ainda inclua excentricidades permitidas. Que a vida em si é meio besta, todos nós sabemos, mas explicar o porquê disso é difícil, é quase uma arte. Nem sempre nos satisfazem filosofias, máximas e clichês sobre o bem e o mal que cada um de nós comporta. Às vezes, faz bem preferir o visto pelo dito.

A história contada no filme cumpre direitinho esse pensamento à-toa que me ocorreu agora. Cada personagem da pequena família de classe média de seis pessoas tem um desajuste. E couberam quatro gerações nela, com a capacidade de resumirem mazelas e grandezas comuns a tantas famílias, a tanta gente. As situações que vão aparecendo no filme, embora esdrúxulas, são perfeitamente possíveis. Um dos grandes baratos da história é o humor negro retirado de circunstâncias patéticas e inesperadas. E elas exigem tomadas de decisões rápidas, uma vez que o objetivo está firmemente traçado: trata-se da realização de um sonho!

O filme é uma homenagem à determinação que extrapola certas esferas e que vale tanto para um chefe de um negócio quanto para um líder de família. Fala também do poder - que nos é tão acessível - de esquecer por uns momentos de nossas próprias frustrações pra mergulhar um pouquinho no sonho do outro que está ali, ao nosso lado. Só que, no caso, esse outro é uma criança, representante clássica da esperança em sua essência. Então, cai como um lenitivo pra nós essa fantasia infantil desavisada das frustrações do caminho. Bastou enxugar com bom humor o espírito dramalhão da película, simplificando o sofrimento que sabemos o tempo todo que está lá, pra nos deliciarmos com a praticidade das coisas, como se pudéssemos largar de vez em quando a mania de complicar tanto a vida.

Pequena Miss Sunshine nos deixa mais leves, mesmo sabendo que em nosso universo limitado a simplicidade e o desprendimento ficaram lá pelo jardim de infância.